"Se as várias estimativas que temos recebido se concretizarem, em 40 anos ficaremos sem peixe"

- Pavan Sukhdev, economista e consultor da ONU, sobre o eventual esgotamento dos recursos piscícolas a nível mundial, em 2050 (In Visão 20/26 Maio 2010)

segunda-feira, 23 de março de 2009

Desta vez fomos ao Zêzere...



Embora conscientes que nada estava a nosso favor, decidimos ir pela primeira vez, pescar trutas ao Zêzere, lá para os lados do Sameiro. O dia estava luminoso e quente, confirmando a chegada oficial da Primavera uns dias antes, mas pouco favorável para pescar “pintonas”.
Saímos já tarde e fomos devagar, porque só assim se pode desfrutar de tudo, sem stress e sem a vontade de estar já junto à água para pescar logo às 5 da madrugada...
Para além disso, tínhamos convencido a mãe, ainda em período de convalescença após a cirurgia, a ir connosco, argumentando que era mais uma forma de preparar o seu regresso ao trabalho...
Não fazíamos ideia onde íamos pescar, porque desconhecíamos por completo a zona. Após uma volta de reconhecimento, entramos num dos acessos à água.
Vadeadoras vestidas, cana preparada e ainda eu não tinha fechado o carro já o ZP estava a fazer os primeiros lançamentos no meio do rio.
- Perdi mesmo agora uma pequena que se soltou, diz ele nervoso…
- O quê, já? É mau sinal…
Entramos um troço bastante largo, baixo e composto por calhaus grandes, eu do lado direito e ele do lado esquerdo do rio. Aqui podemos pescar à pluma sem grandes preocupações porque as arvores estão bem afastadas das margens, ao contrário das ribeiras onde pescamos mais vezes, que são completamente fechadas.
Mas nada de novo, ao fim de uns oitocentos metros de pesca. Entretanto, são horas de uma pausa para comer a sandes que vinha na mochila que a mãe carregava… Como sempre, o ZP nem come descansado e desaparece logo para a água.
Mas logo depois surge a dizer que perdera uma truta de bom tamanho. A mãos tremem-lhe e amaldiçoa o 0.14 que não resistiu ao arranque do peixe.
-Pai, era uma truta com uns trinta e cinco centímetros, tinha-a visto a comer á superfície e lancei. Atacou logo…
Brinquei com ele, para descontrair e disse-lhe que havia mais na água…
Eu recomeço numa pequena queda de água, desta vez com uma imitação de larva de tricóptero, bichos particularmente abundantes nestas águas. Ao acompanhar a linha na corrente, sinto um leve puxão e ferrei.
-Tenho umaaaa…. avisando a minha equipa. O peixe luta contra a corrente, volta ao remanso onde estava, volta à corrente e rende-se, após mais algumas voltas. Depois deixa-se apanhar pela minha mão que o aguarda já molhada, para que o contacto não lhe retire o muco protector, permitindo uma libertação com o máximo de probabilidades de sobrevivência…


- Epá, bonito peixe! - diz o ZP. E é de facto. Pena que ninguém os proteja e lhes suje a casa com tudo o que é mau para eles.
Duas fotos, anzol retirado com cuidado e aí vai ela outra vez para a água, até que se deixe enganar outra vez, o que espero piamente mais nunca aconteça… Assim fica no rio mais um exemplar reprodutor para que tente manter a sua espécie, apesar dos maus tratos que o Homem inflige diariamente ao seu habitat.
Minutos mais tarde o ZP captura uma pequenina com uma mosca seca, em imitação de tricóptero na fase alada, sendo este o último peixe que capturamos nesse dia, apesar de termos visitados vários locais durante a jornada.


Fica-nos também neste belo rio, a sensação do desperdício de recursos naturais a que está votado o nosso país. Há manifestamente muita falta de trutas nos nossos rios salmonídeos. Infelizmente e mais uma vez, o Estado a quem pagamos as nossas licenças de pesca, está-se nas tintas para as suas responsabilidades, deixando um património natural valioso e único, desaparecer de ano para ano.

E não há AFN, nem ICNB, nem SEPNA, nem treta de organismo nenhum que ponha termo a este delapidar duma espécie autóctone. Se os senhores do ICNB se preocupassem minimamente com as nossas espécies autóctones, em vez de se preocuparem em erradicar as exóticas interessantes - como o achigã, faria um trabalho valioso e estaríamos no caminho certo.
Curiosamente, nunca vi na minha vida um rio tão próximo da nascente, com tamanha quantidade de plásticos nas suas margens.

IMPRESSIONANTE, é a única palavra que me vem à cabeça… Não há um palmo de margem, que não tenha um pedaço de plástico, nos vários locais onde pescamos nesse dia. Alguns exemplos para ilustrar...


Onde andam os responsáveis por esta TAMANHA PORCARIA? Onde estão as entidades fiscalizadoras do ambiente?
Como é possível chegar-se a este ponto, no rio que alguns quilómetros a jusante abastece Lisboa ou seja, três milhões de pessoas?
Decididamente e feita a avaliação final, nada nos motiva a regressar…

7 comentários:

Fenix disse...

Gostei do teu texto!
Cheio de força, como sempre!
Como sempre, é o bicho Homem que mais actos irracionais pratica.

Beijinhos e as melhoras para a "mãe".
:-))

São

Anónimo disse...

Gomes querido amigo,
Mais uma vez um relato preciso e carregado de emoção, parabéns.
Logo a pesca estará aberta por aqui, e é triste prever que meus relatos terminarão como o seu, com críticas ao homem e aos órgãos que deveriam educar e proteger.
Um grande abraço

Fenix disse...

Desconfio que não ligas nada ao que eu te venho trazer, mas mesmo assim trago, porque acho que mereces.
Tens presentes aqui.

Beijinhos
São

Anónimo disse...

Boas Gomes Torres.

Infelizmente os cenários continuam…

Continuo a acreditar, que a solução para as águas interiores, passa pelas autarquias, demonstrando-lhes as potencialidades que possuem na região e tomando as associações como moderadoras.

Não tenho tido tempo, para a pesca, mas descobri uma maneira de estar perto daquilo que gosto (os rios)…

Levar os meus pequenitos à descoberta do esconderijo do Indiana Jones, foi a solução.
Permitiu-me dentro das possibilidades descobrir e investigar dois rios de V N Gaia, ao lado de casa e que estavam tão longe( Febros e Uíma, que potencialidade…).

Descobri o que o Parque Biológico, tem contribuído para a recuperação do Febros, com a juda das águas de Gaia e respectiva Câmara Municipal.

Ainda não tive oportunidade de visitar a Freguesia de Sandim, que tem se preocupado com as Margens do Rio Uíma, bem como outras mais perto de Santa Maria da Feira.

Descobri ainda a associações amigos Do Rio Uíma e os Amigos do Rio Caster (em Ovar).

Penso que é só abrir os olhinhos às autarquias e dar-lhes autonomia quanto à preservação dos meios naturais que as rodeiam, porque se for pelo estado em si, eu já não acredito, apesar de saber-mos que a responsabilidade é dele e é para isso que pagamos as nossa licenças.

Desculpem o texto vai longo, já só faltam 2 semanas para ver como está o RioVez, claro está nas águas livres.

Se não tirar nenhuma truta, fico pela beleza natural, alguns arranhões e paz e sossego…
Um Abraço,

NunoCao
NunoCorreia

Anónimo disse...

Boas GT,

Excelente texto! Gostei especialmente da parte do "desfrutar de tudo" que é uma atitude que gosto e que deveria definir o verdadeiro pescador desportivo, inserido no meio. Aos invés da atitude predatória cega de apenas ir apanhar peixes!

Em relação à última parte...
Sabes que as populações rurais não foram educadas para deitarem o lixo nos locais devidos, alias até há bem pouco tempo era rara a aldeia que tinha contentores para o lixo!!!
Ainda me lembro na infancia, de andar no mato e ribeiras da minha terra (Sarzedas e arredores) e trazer a lixarada que não gostava de ver (sacos de plásticos, latas etc) e de ser vivamente desaconselhado pelos + velhos com o argumento de "...atão andamos nós, meu cachopo, a aventar as cousas que não prestam pra longe e tu trazes isso outra vez" etc e blablabla! Compreendo perfeitamente a opinião deles, foram educados assim e não tinham os meios para o fazer de outra maneira (à excepção das queimadas e/ou buracos) e claro, contrapunha com a minha opinião!
Felizmente as atitudes e os meios vão mudando!

Tenho como objectivo para este ano apanhar uma truta à mosca! a ver vamos!


Saudações de 1 Albicastrense "desterrado"!
Marco Ribeiro da Silva

Anónimo disse...

Boas amigo!!

Bem essa trutita é pequenina mas sem duvida de uma beleza como só as nossas fario conseguem ter!!
subscrevo tudo o que disses-te no teu texto menos o nome do rio como sabes eu gosto muito do mondego apesar de o zezere ser sem duvida mais apelativo para a pluma!! (pelo menos não ficam tantas a enfeitar as arvores!!)
É verdade amigo temos nós aqui dois rios com condições fantasticas para as nossas queridas trutas mas infelismente para quem gosta mesmo de as pescar elas cada vez são mais raras e menos protegidas pelas autoridades mas principalmente pela maior parte daqueles que se dizem pescadores!!
Nem imaginas a quantidade de trutas com mais de 2 kilos que tem saido no caldeirão este ano e o pessoal só as vé acompanhadas com batatas e não como excelentes reprudutores que poderiam vir a ser para garantir a sobrevivençia das nossas querida trutas!!
Este domingo é mais uma jornada pelo «meu» mondego para passar uma manhã em beleza como nós tanto valor damos!!

Um grande abraço para voces e votos de uma boa recuperação para a tua senhora!!

José Gomes Torres disse...

Fenix, obrigado pelas tuas palavras. Sim, somos nós quem mais mal faz, a nós próprios...
Junior, parece que o mal é comum, não é? Porquê?
Nuno Correia, o não apanhar trutas é o menos, concordo! O pior é o triste espectáculo que nos é dado a observar...
Marco Silva, conterrâneo desterrado :-) se um dia quiser combinar qualquer coisa, estamos por cá. Nem que seja beber um café...
Custódio, não devias ter escrito isso das trutas grandes...
Amigos, obrigado pelas vossas palavras e participem sempre...